proj.: sem titulo
Ana Rita Coelho
O meu propósito primordial é simples: formar-me enquanto pessoa e enquanto designer, que é o mesmo que dizer, enquanto indivíduo com curiosidade pelo que o rodeia, que procura obter uma cultura geral e, pela sua profissão de designer, com a mais-valia de produzir conhecimento e comunicá-lo a outrem de uma forma simples e geradora de empatia.
Ambiciono ser capaz de criar ou re-criar um conhecimento com alegria, com atitude positiva, que lance nas pessoas o interesse e entendimento de si próprias e dos outros, do seu ambiente contextual, com vista a uma possível progressão através da poesia do afirmativo, através do formar de um sorriso. Falo no sorriso porque sintéticamente é uma das formas mais poderosas de propiciação de empatia, motivação e, consequentemente, trabalho, ou seja, progressão. Quero mencionar tanto o sorriso literal de alguém com um sorriso na face, como aquele que é vivido interiormente pela experiência ou memória de um dia com uma luminosidade excepcional; formado graças ao ritmo musical da engrenagem de uma bicicleta, ou originado pelo contacto com uma certa textura num chão, colorido com folhagens de Outono e fresco com a humidade da manhã.
Como pessoa e designer, uma questão que se me depara com especial relevo é a pertinência e necessidade de criação de conforto. Por outras palavras, a urgência em aprender a ter uma atitude colorida, musical, positiva; como a que observei a propósito da minha viagem e vivência na Holanda. Portugal tem todos os meios para nos inspirar felicidade: possui ritmos topológicos e geográficos riquíssimos, texturas da gastronomia e dos rituais muito fortes; que só faz sentido que sejam valorizados. Há que parar uma generalizada auto e hetero-flagelação quando possuímos na vida que nos rodeia muitas razões gratificantes. A mesma vida que nos traz insatisfação, que possui problemas a que nenhum de nós está indiferente (temos questões como o caos urbano; as autênticas cidades artificiais celebradoras da futilidade, ou os chamados shoppings; questões como o alheamento ou marginalização em relação ao acesso à cultura...) mas onde podemos também encontrar pontos que servem de solução ou, pelo menos, inspiradores de hipóteses que contrariam essas crises. Como já referi, temos, designadamente, ambiente natural, sol, desencadeadores de luminosidade e energia afirmativa.
Sendo estudante de design, uma profissão eminentemente mediática, tenho os meios ou, melhor, a responsabilidade de que o meu trabalho traduza esta situação que me parece premente: quero implementar em mim e naqueles que visualizem o meu projecto vontade de querer melhorar como profissionais, como cidadãos, como agentes inter-relacionais capazes de se inspirar na vida, nas imagens e sons que nos rodeiam, para obter uma sensação libertadora. Pretendo neste projecto lembrar que esta liberdade, advinda da reflexão, do encontro com o meio ambiente, com a vida em geral, se encontra ao alcance de cada um e é importante que inspire o nosso comportamento, as nossas relações, o nosso trabalho.
"Mais do que decidir o que quer fazer, o Designer precisa de se preocupar com o que precisa de ser feito - a equação é semelhante mas o fluxo é o oposto: a primeira propõe a visão potencialmente autista do criador, enquanto que a segunda parte das realidades exteriores a quem cria e propõe que o criador se defina antes de mais como veículo, como agente gerador de empatia." (Heitor Alvelos, FBAUP, Janeiro 2005)
Em traços muito simples, o que eu pretendo desenvolver neste projecto final como discente que teve a feliz oportunidade de viver durante aproximadamente quatro meses em Roterdão, na Holanda e nela viajar, privar com gente de todo o mundo, e para onde levei toda uma formação e um filtro para as interpretações portugueses; ambiciono, mais do que diferenciar, encontrar pontos de contacto entre estes locais. Designadamente, pontos que têm relação com o conceito de liberdade, ou seja, aqueles que têm a ver com o que é natural e autêntico em cada um deles, mas sempre potenciador de felicidade.
Procederei a uma recolha de material, de memórias e vivências sonoras e visuais sintéticas e ilustrativas do meu espaço natal, como também usarei arquivos audio-visuais do meu intercâmbio Erasmus (possuo registos que prefazem mais de vinte horas em mini-dv) para este trabalho. Pretendo que a evocação destas referências e emoções vivenciais dos diversos locais, veincule, nos que a usufruírem e com ela interagirem, uma reflexão e conforto pela alegria visual e sonora.
Como se afere da exposição "Multimedia e Artes do Tempo" do Professor Vítor Almeida, um modo de legitimar esta expressão da memória ou imaginário pessoal face à colectividade, passa pela sua democratização, ou seja, pela sua tradução em forma de hipernarrativa que é algo - a nível formal, técnico e temático - que pretendo realizar. Isto é, algo onde o usufruidor é interpelado a participar e interagir com as minhas vivências e interpretações e torná-las suas, criando a sua própria narrativa, enfim, intimando-o a construir as suas próprias conclusões sobre o que lhe é exposto, tal como eu também contruí interpretações sobre o que se me deparou.
Uma vez mais, saliento o facto de vivermos numa sociedade que procura o bem-estar, uma sociedade que procura a todo o custo a liberdade, por vezes da forma menos própria, tem as mais diversas terapias para aliviar a dor (a terapia da cor, a terapia dos aromas, etc.) O meu design com emoção ou com um lado espiritual, posso dizer que tentará re-criar uma sensação de conforto em outrem e alertá-lo para que a vida está cheia de coisas bonitas.
" (...) vale a pena perguntar: somos livres? Se somos dá a ideia de que o grande benefeciário foi a indústria farmacêutica. O que não falta aí são psiquiatras para nos receitarem psicotrópicos que nos permitam aguentar o mundo sem rédeas que nos rodeia. (...) como indicam as estatísticas, o medicamento mais receitado aos Portugueses pelos médicos de família dos Centros de Saúde é o Prozac (...) como anunciou há tempos a Comunicação Social, Portugal é o país do Ocidente com maior consumo de ansiolíticos e antidepressivos per capita (...)
A gente tem a Sexta-Feira Santa, temos o anho pascal, tudo coisas lindas e antigas que eles não têm. Até temos o Enterro do Bacalhau, uma festividade extremamente pitoresca e completamente desleixada. Vamos ter de trocar isto tudo pelo Thanksgiving?" (Clara Pinto Correia, Trinta Anos de Democracia e Depois, Pronto: 94, 100)
Pelo contrário, teremos é de trocar esta nossa atitude de autocomiseração por uma atitude de orgulho do que temos. Acto que se constitui como "um programa que nos permitiria viver com mais calma e disponibilidade. E, entre outras coisas, passarmos mais tempo uns com os outros. Ficarmos sossegados ao ponto de conseguirmos amar-nos mais. Os Portugueses andam a namorar pouco, a beijar pouco, a sonhar e a suspirar de prazer muito pouco. Não estou a falar de sexo. Estou a falar de carinho, de ternura, de bem-estar e de entrega. Daquelas coisas que valem tudo na vida, e nos fazem logo vê-la com outros olhos." (Clara Pinto Correia: 101)
Não tenciono fazer um enaltecimento desastroso, desproporcionado e esteriotipado de Portugal-folclórico-x e Holanda-y, pelo contrário, tenciono sublinhar o que há de comum em ambos os ambientes no que concerne à poesia do exercício da liberdade que se expressa nos mais singelos momentos do quotidiano mas de grande humanidade. (Por exemplo, o encontro de amigos, o partilhar de refeições, visita a eventos culturais, o passear do animal doméstico.) O orgulho que ambas as culturas demonstram por esses momentos é que parece diferente.
Termino com um poema de Fernado Pessoa que serviu de base para a hipernarrativa que criei em Roterdão e que servirá de ponto de partida sintético do tema que pretendo ilustrar:
"LIBERDADE
Ai que prazer / não cumprir um dever. Ter um livro para ler / e não o fazer! / Ler é maçada, / estudar é nada. / O sol doira sem literatura. / O rio corre bem ou mal, / sem edição original. / E a brisa, essa, de tão naturalmente matinal / como tem tempo, não tem pressa. / Livros são papéis pintados com tinta. / Estudar é uma coisa em que está indistinta / a distinção entre nada e coisa nenhuma. / Quanto melhor é quando há bruma, / Esperar por D. Sebastião, / Quer venha ou não! / Grande é a poesia, a bondade e as danças... / Mas o melhor do mundo são as crianças, / Flores, música, o luar e o sol que peca / Só quando, em vez de criar, seca. / E mais do que isto / É Jesus Cristo, / Que não sabia nada de finanças, / Nem consta que tivesse biblioteca..."
Porto, Janeiro de 2005
O meu propósito primordial é simples: formar-me enquanto pessoa e enquanto designer, que é o mesmo que dizer, enquanto indivíduo com curiosidade pelo que o rodeia, que procura obter uma cultura geral e, pela sua profissão de designer, com a mais-valia de produzir conhecimento e comunicá-lo a outrem de uma forma simples e geradora de empatia.
Ambiciono ser capaz de criar ou re-criar um conhecimento com alegria, com atitude positiva, que lance nas pessoas o interesse e entendimento de si próprias e dos outros, do seu ambiente contextual, com vista a uma possível progressão através da poesia do afirmativo, através do formar de um sorriso. Falo no sorriso porque sintéticamente é uma das formas mais poderosas de propiciação de empatia, motivação e, consequentemente, trabalho, ou seja, progressão. Quero mencionar tanto o sorriso literal de alguém com um sorriso na face, como aquele que é vivido interiormente pela experiência ou memória de um dia com uma luminosidade excepcional; formado graças ao ritmo musical da engrenagem de uma bicicleta, ou originado pelo contacto com uma certa textura num chão, colorido com folhagens de Outono e fresco com a humidade da manhã.
Como pessoa e designer, uma questão que se me depara com especial relevo é a pertinência e necessidade de criação de conforto. Por outras palavras, a urgência em aprender a ter uma atitude colorida, musical, positiva; como a que observei a propósito da minha viagem e vivência na Holanda. Portugal tem todos os meios para nos inspirar felicidade: possui ritmos topológicos e geográficos riquíssimos, texturas da gastronomia e dos rituais muito fortes; que só faz sentido que sejam valorizados. Há que parar uma generalizada auto e hetero-flagelação quando possuímos na vida que nos rodeia muitas razões gratificantes. A mesma vida que nos traz insatisfação, que possui problemas a que nenhum de nós está indiferente (temos questões como o caos urbano; as autênticas cidades artificiais celebradoras da futilidade, ou os chamados shoppings; questões como o alheamento ou marginalização em relação ao acesso à cultura...) mas onde podemos também encontrar pontos que servem de solução ou, pelo menos, inspiradores de hipóteses que contrariam essas crises. Como já referi, temos, designadamente, ambiente natural, sol, desencadeadores de luminosidade e energia afirmativa.
Sendo estudante de design, uma profissão eminentemente mediática, tenho os meios ou, melhor, a responsabilidade de que o meu trabalho traduza esta situação que me parece premente: quero implementar em mim e naqueles que visualizem o meu projecto vontade de querer melhorar como profissionais, como cidadãos, como agentes inter-relacionais capazes de se inspirar na vida, nas imagens e sons que nos rodeiam, para obter uma sensação libertadora. Pretendo neste projecto lembrar que esta liberdade, advinda da reflexão, do encontro com o meio ambiente, com a vida em geral, se encontra ao alcance de cada um e é importante que inspire o nosso comportamento, as nossas relações, o nosso trabalho.
"Mais do que decidir o que quer fazer, o Designer precisa de se preocupar com o que precisa de ser feito - a equação é semelhante mas o fluxo é o oposto: a primeira propõe a visão potencialmente autista do criador, enquanto que a segunda parte das realidades exteriores a quem cria e propõe que o criador se defina antes de mais como veículo, como agente gerador de empatia." (Heitor Alvelos, FBAUP, Janeiro 2005)
Em traços muito simples, o que eu pretendo desenvolver neste projecto final como discente que teve a feliz oportunidade de viver durante aproximadamente quatro meses em Roterdão, na Holanda e nela viajar, privar com gente de todo o mundo, e para onde levei toda uma formação e um filtro para as interpretações portugueses; ambiciono, mais do que diferenciar, encontrar pontos de contacto entre estes locais. Designadamente, pontos que têm relação com o conceito de liberdade, ou seja, aqueles que têm a ver com o que é natural e autêntico em cada um deles, mas sempre potenciador de felicidade.
Procederei a uma recolha de material, de memórias e vivências sonoras e visuais sintéticas e ilustrativas do meu espaço natal, como também usarei arquivos audio-visuais do meu intercâmbio Erasmus (possuo registos que prefazem mais de vinte horas em mini-dv) para este trabalho. Pretendo que a evocação destas referências e emoções vivenciais dos diversos locais, veincule, nos que a usufruírem e com ela interagirem, uma reflexão e conforto pela alegria visual e sonora.
Como se afere da exposição "Multimedia e Artes do Tempo" do Professor Vítor Almeida, um modo de legitimar esta expressão da memória ou imaginário pessoal face à colectividade, passa pela sua democratização, ou seja, pela sua tradução em forma de hipernarrativa que é algo - a nível formal, técnico e temático - que pretendo realizar. Isto é, algo onde o usufruidor é interpelado a participar e interagir com as minhas vivências e interpretações e torná-las suas, criando a sua própria narrativa, enfim, intimando-o a construir as suas próprias conclusões sobre o que lhe é exposto, tal como eu também contruí interpretações sobre o que se me deparou.
Uma vez mais, saliento o facto de vivermos numa sociedade que procura o bem-estar, uma sociedade que procura a todo o custo a liberdade, por vezes da forma menos própria, tem as mais diversas terapias para aliviar a dor (a terapia da cor, a terapia dos aromas, etc.) O meu design com emoção ou com um lado espiritual, posso dizer que tentará re-criar uma sensação de conforto em outrem e alertá-lo para que a vida está cheia de coisas bonitas.
" (...) vale a pena perguntar: somos livres? Se somos dá a ideia de que o grande benefeciário foi a indústria farmacêutica. O que não falta aí são psiquiatras para nos receitarem psicotrópicos que nos permitam aguentar o mundo sem rédeas que nos rodeia. (...) como indicam as estatísticas, o medicamento mais receitado aos Portugueses pelos médicos de família dos Centros de Saúde é o Prozac (...) como anunciou há tempos a Comunicação Social, Portugal é o país do Ocidente com maior consumo de ansiolíticos e antidepressivos per capita (...)
A gente tem a Sexta-Feira Santa, temos o anho pascal, tudo coisas lindas e antigas que eles não têm. Até temos o Enterro do Bacalhau, uma festividade extremamente pitoresca e completamente desleixada. Vamos ter de trocar isto tudo pelo Thanksgiving?" (Clara Pinto Correia, Trinta Anos de Democracia e Depois, Pronto: 94, 100)
Pelo contrário, teremos é de trocar esta nossa atitude de autocomiseração por uma atitude de orgulho do que temos. Acto que se constitui como "um programa que nos permitiria viver com mais calma e disponibilidade. E, entre outras coisas, passarmos mais tempo uns com os outros. Ficarmos sossegados ao ponto de conseguirmos amar-nos mais. Os Portugueses andam a namorar pouco, a beijar pouco, a sonhar e a suspirar de prazer muito pouco. Não estou a falar de sexo. Estou a falar de carinho, de ternura, de bem-estar e de entrega. Daquelas coisas que valem tudo na vida, e nos fazem logo vê-la com outros olhos." (Clara Pinto Correia: 101)
Não tenciono fazer um enaltecimento desastroso, desproporcionado e esteriotipado de Portugal-folclórico-x e Holanda-y, pelo contrário, tenciono sublinhar o que há de comum em ambos os ambientes no que concerne à poesia do exercício da liberdade que se expressa nos mais singelos momentos do quotidiano mas de grande humanidade. (Por exemplo, o encontro de amigos, o partilhar de refeições, visita a eventos culturais, o passear do animal doméstico.) O orgulho que ambas as culturas demonstram por esses momentos é que parece diferente.
Termino com um poema de Fernado Pessoa que serviu de base para a hipernarrativa que criei em Roterdão e que servirá de ponto de partida sintético do tema que pretendo ilustrar:
"LIBERDADE
Ai que prazer / não cumprir um dever. Ter um livro para ler / e não o fazer! / Ler é maçada, / estudar é nada. / O sol doira sem literatura. / O rio corre bem ou mal, / sem edição original. / E a brisa, essa, de tão naturalmente matinal / como tem tempo, não tem pressa. / Livros são papéis pintados com tinta. / Estudar é uma coisa em que está indistinta / a distinção entre nada e coisa nenhuma. / Quanto melhor é quando há bruma, / Esperar por D. Sebastião, / Quer venha ou não! / Grande é a poesia, a bondade e as danças... / Mas o melhor do mundo são as crianças, / Flores, música, o luar e o sol que peca / Só quando, em vez de criar, seca. / E mais do que isto / É Jesus Cristo, / Que não sabia nada de finanças, / Nem consta que tivesse biblioteca..."
Porto, Janeiro de 2005
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